quarta-feira, 17 de junho de 2009

Por que não gosto da Religião?

Mario Quintana disse que "qualquer ideia que te agrade, por isso mesmo... é tua. O autor nada mais fez que vestir a verdade que dentro em ti se achava inteiramente nua...". Assim sendo, escolhi o seguinte parágrafo de Frederich Nietzsche, em que ele expressa o que eu sinto em relção à religião, vestindo a idéia que se achava em mim inteiramente nua: o alto preço que a religião cobra pelo sentido e pelos confortos que dá à nossa vida.

"O desprezo das causas, das conseqüências e da realidade. – Esses acasos ruins que atingem uma comunidade – súbita tempestade, seca ou epidemia – levam todos os seus membros a suspeitar que foram cometidas infrações ao costume, ou que novos usos têm de ser inventados para apaziguar um novo poder e humor demoníaco. Esse gênero de suspeita e reflexão evita justamente a sondagem das verdadeiras causas naturais, tomando a causa demoníaca por pressuposto. Eis uma fonte da hereditária inversão do intelecto humano: e a outra fonte brota vizinha, ao conceder-se, igualmente por princípio, bem menor atenção às verdadeiras conseqüências naturais de uma ação do que às sobrenaturais (as chamadas punições e graças da divindade). Prescrevem-se, por exemplo, determinados banhos em determinados momentos: o indivíduo não se banha para ficar limpo, mas porque está prescrito. Não aprende a escapar às verdadeiras conseqüências do desasseio, mas ao suposto desagrado dos deuses por negligenciar um banho. Oprimido por um supersticioso temor, desconfia que essa lavagem da impureza tenha uma importância maior, atribui-lhe um segundo e um terceiro significados, estraga seu próprio sentido e gosto pelo que é real, terminando por considerá-lo valioso apenas na medida em que pode ser símbolo. Sob o julgo da moralidade do costume, portanto, o homem despreza primeiramente as causas, em segundo lugar, as conseqüências, em terceiro, a realidade, e tece com todos os seus sentimentos superiores (de reverência, de elevação, de orgulho, de gratidão, de amor) um mundo imaginário: o chamado mundo superior. E ainda hoje vemos a conseqüência: onde o sentimento de um homem se eleva, de algum modo entra em jogo esse mundo imaginário. É triste, mas por enquanto todos os sentimentos superiores têm de ser suspeitos para o homem científico, de tal modo se acham mesclados com a ilusão e contra-censo. Não que tenham de sê-lo em si ou para sempre: mas é certo que, de todas as graduais purificações que esperam a humanidade, a purificação dos sentimentos superiores será uma das mais graduais.” (Nietzsche Friedrich Wilhelm. Aurora: reflexões sobre os preconceitos morais. São Paulo: Schwarcz, 2004, p. 34 e 35)
(Grifei)

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Ah! Os Relógios



O poema abaixo, de Mario Quintana é uma ilustração ao fato já bem debatido pelos intelectuais da arte que a arte é um meio de reflexão necessário para libertar as pessoas das limitações do seu conhecimento. Fazemos a arte (música, pintura, teatro) no fundo para buscar um conhecimento maior, além das convicções formais e convencionais. Pois este poema usa sua liberdade para sugerir que questionemos a idéia arrogante do tempo, ficção de nossa ilusão.

Ah! O Relógios


Amigos, não consultem os relógiosquando um dia eu me for de vossas vidas
em seus fúteis problemas tão perdidas
que até parecem mais uns necrológios...

Porque o tempo é uma invenção da morte:
não o conhece a vida - a verdadeira -
em que basta um momento de poesia
para nos dar a eternidade inteira.

Inteira, sim, porque essa vida eterna
somente por si mesma é dividida:
não cabe, a cada qual, uma porção.

E os Anjos entreolham-se espantados
quando alguém - ao voltar a si da vida -
acaso lhes indaga que horas são...

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Espiritismo: religião ou falsa ciência?


Meu ranso com o espiritismo é que suas idéias o fazem vacilar entre a fé e a razão. Bem diferentemente, alguns padres católicos apresentam sua fé cristã da seguinte forma: consideram absurdo a recomendação, de São Tomé, de “ver pra crer”, pois, segundo eles, aquilo o que vêem é aquilo que sabem, enquanto que sua crença, ou seja sua religião, se baseia naquilo em que crêem, por meio de sua religiosidade íntima. Na medida em que o espiritismo é erigido pelo conjunto de teses elaboradas a partir do contato de seus médiuns com espíritos, esta doutrina se afirma no campo da razão, como uma ciência, baseando-se, portanto, em experiências empíricas, por meio das quais a razão humana procura conhecer e compreender a realidade. O problema é que ele não possui provas científicas, tampouco método científico, relegando-se à condição de pseudociência, isto é, falsa ciência.

Isto não significa que a crença espírita seja de alguma forma menos considerável ou respeitável que as demais. Isto apenas significa que a forma com que se apresenta, pretensiosa de adquirir a condição de verdade científica, a rebaixa da condição que poderia ter como religião ou, melhor, filosofia.

Platão acreditava na existência de um mundo das idéias, do qual este mundo concreto é uma mera e pálida reprodução, e o qual possui a essência responsável pelas características inerentes às coisas, à sua determinação. O mundo das idéias encerra as formas que se repetem nas coisas, isto é, as determinações observadas no mundo concreto. As variações e deformações, as diferenças individuais, as falhas, as indeterminações se devem à existência concreta das coisas, que é uma reprodução, uma cópia, da essência ideal impulsionada pela forma e idéia perfeita do mundo das idéias. Por exemplo, a forma comum de um cavalo (todos possuiem crina, quatro patas, rabo) se deve à essência do cavalo que reside no mundo das idéias, composto apenas daquilo que todos os cavalos possuem em comum.

Além disso, o filósofo acreditava em uma teoria de certa forma semelhante ao espiritismo, a gnosiológica, segundo a qual as pessoas, ao observarem um objeto repetidas vezes, recordam de experiências anteriores ao seu nascimento, da época em que habitavam o mundo das idéias. Antes de nascer, a alma de cada pessoa vivia em uma estrela, onde se localizam as Idéias. Quando uma pessoa nasce, sua alma é jogada para a Terra, e o impacto que ocorre faz com que esqueça o que viu na estrela. Mas, ao ver um objeto aparecer de diferentes formas (como as diferentes árvores que se pode ver), a alma se recorda da Idéia daquele objeto que foi visto na estrela. Tal recordação, em Platão, chama-se anamnesis. Íntima é sua proximidade com o que Vinícius de Morais dizia sobre os amigos: não se conhecem, se reconhecem.

Enfim, Platão possuía uma filosofia, uma convicção íntima, como poderia se chamar as crenças cultivadas nos dias de hoje, com a diferença de a sua crença ser inspirada por sua reflexão lógica, sua meditação sobre o mundo, por uma tentativa de organizar as coisas à sua volta e ler suas implicações. Ele não apresentava provas ou relatórios de contatos com espíritos: não precisava violar os limites de seu conhecimento físico, precisamente porque sua crença não pretendia ser uma ferramenta científica ou um dogma sedutor, mas uma fonte de elevação, de sincera e humilde busca pela verdade, no rumo contrário ao que assumiu o nosso espiritismo e seus médiuns hipócritas. Por estas razões, procuro sensibilizar a todos, inclusive os espíritas, a respeitar a opinião de todos e questionar o modo pelo qual se apresenta entidades como a espírtia, para afastar sua pretensão de verdade revelada, coisa que não existe e, se existe, é para enganar os humildes.